segunda-feira, 9 de maio de 2011

Ai meu Deus, que horas são?

"Precisava é de tempo."

Tempo. Eu preciso de tempo, você precisa de tempo, ele precisa de tempo, vós precisais de tempo, o mundo inteiro, eles, precisam de tempo. Mas quem tem tempo? Ninguém mais tem tempo, tempo ninguém tem mais, nem tempo nem ninguém tem um ao outro. Nem tempo nem tempero. Muito tempo tapado pra pouco tempo temperado, pouco tempo temperado pra mil anos desperdiçados em tempos imprecisos. O tempo correu de mim, correu dele, correu dela, nós não sabemos onde o tempo está, o senhor sabe? Ninguém sabe, a mulher no Jornal Nacional não tem tempo (digamos à parte que, nem tempero), e há tempos ela sabe tudo. Tapado o tempo temperado, escondido esculachado estúpido, fujão fugido forasteiro, que brinca com nossas caras e desde que nos entendemos por gente vem tirando nosso tempo.

segunda-feira, 21 de março de 2011

Eu (...?)

"Tão geladas as pernas e os braços e a cara que pensei em abrir a garrafa para beber um gole, mas não queria chegar na casa dele meio bêbado, hálito fedendo, não queria que ele pensasse que eu andava bebendo, e eu andava, todo dia um bom pretexto, e fui pensando também que ele ia pensar que eu andava sem dinheiro, chegando a pé naquela chuva toda, e eu andava, estômago dolorido de fome, e eu não queria que ele pensasse que eu andava insone, e eu andava, roxas olheiras, teria que ter cuidado com o lábio inferior ao sorrir, se sorrisse, e quase certamente sim, quando o encontrasse, para que não visse o dente quebrado e pensasse que eu andava relaxando, sem ir ao dentista, e eu andava, e tudo que eu andava fazendo e sendo eu não queria que ele visse nem soubesse, mas depois de pensar isso me deu um desgosto porque fui percebendo, por dentro da chuva, que talvez eu não quisesse que ele soubesse que eu era eu, e eu era."

trecho do conto "Além do Ponto" - Caio Fernando Abreu

sábado, 19 de fevereiro de 2011

Metade

Por tanto tempo tentei ser forte
Por tanto tempo me orientei pelo norte
Buscar o certo que me completa por dentro
Ou que me preencha mais que sua morte

Por tanto tempo fui fiel
Por tanto tempo cumpri minha promessa
De ignorar o passado que me é cruel
E o choro que não cessa

Por tanto tempo lutei pelo mesmo ponto de vista
Batalhei pela nossa maior conquista
Deixei de lado a dor e a agonia
Pelo nosso sonho de sermos um só artista

Por tanto tempo...
Me perguntei o que você diria
Pro sussurro do vento
Na minha alma que perecia

Perece, eu corrigiria
Faria do vento sangue puro
Escorrendo pelo meu corpo saudável
Que daria tudo pra ser incurável
Nos dias de terror interno
Quais você me consome enfermo
Mas acaba com a minha doença
E impede que a insônia vença.

Hoje tenho os olhos inchados
Molhados, avermelhados
De sentir sua falta.

Será que tens um meio de renascer pra mim?
Porque eu não aguento mais, amigo
Eu prometi não correr perigo
Mas minhas forças têm fim.